SQ#20: Escalabilidade Surreal
Negócios escaláveis, o preço do dinheiro, finitude do tempo & mais.
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Bem-vindos à edição de número #20 da "Status Quê?”. Aqui, trago provocações e inspirações para te tirar do automático e te fazer (re)pensar as escolhas de vida. Toda semana. Sem Spam. Grátis.
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Bora lá então!
Na minha vida profissional dos últimos 15 anos, aprendi e fui treinado para pensar uma “verdade absoluta”: para um negócio ser promissor, este precisa ser escalável.
Escalabilidade?
No contexto dos negócios, escalabilidade geralmente se refere à capacidade de uma empresa aumentar sua produção ou receitas, mantendo seus custos marginais estáveis ou até mesmo reduzindo-os.
Exemplo:
Softwares são vistos como escaláveis porque, após desenvolvidos, atendem muitos usuários sem grandes custos adicionais. Por outro lado, um serviço artesanal feito à mão pode ser menos escalável, pois produzir em grandes volumes pode exigir muito mais pessoas e tempo.
“Se algo não for escalável, você não vai ter como acelerar o crescimento da empresa de maneira eficiente e nem, do ponto de vista pessoal, ficar multimilionário” - afirmam. Talvez seja verdade na maioria dos casos.
Papo Desconfortável
Nesse final de semana eu tive um papo com um grande amigo, que é um executivo super bem-sucedido do mercado.
Conversávamos sobre a minha empresa, a Limbic - uma produtora de audiovisual (na prática, sou um “eupresário” fazendo vídeos com minhas câmeras e drone para alguns segmentos de mercado).
Um business não muito escalável (ou zero escalável) porque depende do meu tempo - para capturar os vídeos e editá-los.
Pela primeira vez na vida, não almejo me tornar multimilionário. Como eu sempre brinquei… “Agora estou atrás do meu segundo milhão; o primeiro eu já desisti”.
Na verdade eu quero ganhar dinheiro sim, não vou negar. Mas a questão agora é quanto vai custar para eu ganhar esse dinheiro. Quanto tenho que pagar com tempo, saúde, bem-estar, etc.
Dependendo do preço, não vale - para mim. Sou metamorfose ambulante? Sim. Mas isso dificilmente vai mudar. Talvez até se acentue, dada a nossa contagem regressiva de tempo (sem drama, mas real).
No papo eu contava sobre alguns feitos como empreendedor. E o comentário do meu amigo, depois de eu contar sobre o último trabalho, foi:
“Boa, agora precisa escalar, entender como fazer para executar uns 5 projetos desse ao mesmo tempo, em paralelo”.
Eu respondi, um tanto contrariado: “Não…. eu sei que isso não é escalável (da maneira que quero fazer), e tá tudo bem… eu quero executar poucos e bons projetos, relevantes, rentáveis e que me garantam o que eu preciso. Não quero montar uma agência enorme, só quero uma estrutura enxuta (ou só eu talvez) - e me divertir no processo”.
“Tipo artista então?” - disse ele num tom descontraído, brincando comigo - sem julgamento ou desmerecimento (porque ele é amigo mesmo, daqueles do coração).
Eu sorri e não soube responder. Nem sei se respondi algo. A frase ficou reverberando na minha cabeça (está até agora). Isso me causou algo, de fato.
Primeiro, porque me tornei quem eu já julguei e critiquei no passado. Eu me julgaria como um “sem ambição” - que nem é o caso, e talvez seja até o contrário. Minha ambição é gigante, mas não pelo dinheiro por si só. Mas, sim, pelo tempo e bem-estar.
Segundo porque eu refleti sobre a frase em si do ponto de vista dos artistas. Artistas são mais felizes? Se sim, que honra ser um - to dentro! Artistas são mais preocupados com a forma com a qual impactam o mundo, com a forma com que se expressam, com a forma como entendem o externo, com a forma como traduzem coisas complexas em sinais, em códigos, em abstração? Se sim, to super dentro também!
Talvez artistas não sejam, em sua maioria, bons para ganhar dinheiro. Não o são por opção em alguns casos, e não o são porque infelizmente nossa cultura também não os privilegia como deveriam. Pense quantos artistas você conhece que poderiam ser muito bem pagos pela capacidade e talento que possuem? Toda vez que vejo um super músico talentoso, por exemplo, em algum lugar eu penso “Por que essa pessoa não é muito rica? Ela faz coisas que poucos conseguem fazer, alegra muita gente, impacta positivamente a vida das pessoas. Tem muita gente que é o total contrário disso e ganha bastante dinheiro”.
Criatividade e Aptidão
Eu deixei meu lado criativo dormente por muito tempo. Escolhi fazer engenharia elétrica, que é um universo cartesiano, binário, de precisão. Depois fui trabalhar com coisas pouco criativas, embora minha criatividade para fazê-las ou “dar aquele jeito” em alguns obstáculos até que foi exercitada de alguma forma.
Semana passada encontrei um colega de universidade, um veterano da Elétrica, que acabou encaminhando sua carreira para o lado de humanas - sendo muito bem sucedido no universo de Recursos Humanos. Acabou fazendo cursos e especializações na área de filosofia, antropologia, ciências humanas (sim, um engenheiro diferenciado!). Ele agora está montando um negócio próprio nesta área de RH que, de uma maneira resumida, vai olhar para as pessoas por duas perspectivas complementares: os seus skills (aquilo em que são muito bons e pagos por fazer) e aptidões (algum talento que possuem, interesses, mas não desenvolvidos por falta de exposição, vivência, oportunidades). Muda bastante o jogo trabalhar e enxergar o ser humano desta maneira, porque em geral só valorizamos e olhamos para aquilo que “já é” (skill), o curto prazo. Esquecemos do que “pode ser ou se tornar” (aptidão).
E isso traduz demais o meu momento: quero desenvolver minhas aptidões, por exemplo, como videomaker e fotógrafo. Já até consigo ser pago por isso, mas não considero um skill desenvolvido o suficiente. Sei, com bastante humildade, minhas limitações e que ainda há muita estrada pela frente de aprendizagem e conhecimento. Quanto mais sei, mais sei que menos sei realmente. Mas é um caminho de aptidão sim, do exercício de minha criatividade, do meu olhar pelas lentes, dos meus storytellings e roteiros de vídeos, da minha criatividade como “aprendiz de Youtube”, livros, e minhas gambiarras (que nada mais são do que a criatividade para resolver coisas com escassez de ferramentas ou recursos).
A Finitude do Tempo (para variar):
Agora uma história para embasar o próximo ponto da reflexão toda de hoje.
Estou tentando estabelecer um hábito noturno com minha filha Luiza, de 4 anos, na hora de dormir. Embora o horário não seja muito fixo (algo que preciso ajustar!), todos os dias temos o nosso "rolê da noite". Isso envolve dar banho, administrar a sequência de remédios, escovar os dentes, vestir o pijama e finalmente, levá-la para a cama. A etapa de fazê-la dormir é, sem dúvida, a mais desafiadora. O jogo mental que uma criança de 4 anos joga é algo que somente pais podem compreender.
Na luta contra o sono, surge todo tipo de pedido, desde vontade de beber água, ir ao banheiro ou sentir fome. E não podemos esquecer dos insistentes pedidos de “só mais uma história, mais um livro”, frequentemente feitos com uma vozinha fina e com a expressão do gato do Shrek. Em algum momento, é necessário estabelecer um limite e dizer: “agora vamos ficar quietinhos e dormir". Mas há um “jeito nosso” (meu e da Luiza) específico que criei, sobre o qual tenho sentimentos ambíguos, especialmente após um episódio de algumas semanas atrás. Em uma dessas noites, Luiza me pediu - depois de chorar por não entender o limite que impus do horário: “papai, me balança um pouco no colo então para eu parar de chorar e dormir”, algo que se tornou costumeiro. Porém, naquela noite, respondi: “hoje o papai está cansado e com dor nas costas, vamos ter que ficar deitados e pegar no sono aqui mesmo". Sua reação foi um choro ainda mais intenso, e ela disse algo que me impactou profundamente:
“Papai, quando eu tiver 5 anos eu não vou querer mais colo, então só mais um pouquinho, vai…"
Sem hesitar, peguei-a nos braços e balancei-a até que adormecesse, e teria feito isso até sentir minha coluna falhar acho. Ela me lembrou (com um soco, praticamente) de quão efêmero é o tempo. E fiquei também orgulhoso da argumentação apelativa dela (depois que minhas costas pararam de doer).
Escalabilidade do Tempo
Talvez seja uma coisa surreal, que Salvador Dali soube bem codificar em sua obra The Persistency of Memory, que alguns conhecem também como Melting Clocks (imagem de capa desta edição de número 20). O fato é que o tempo não para, e a certa altura da vida a gente precisa escolher melhor onde alocar todo nosso tempo - porque nos damos contas de sua escassez com mais propriedade. Se eu escalar um negócio, sem levar em consideração algumas variáveis, posso ter que competir com o tempo (e qualidade) de colo da Luiza - dentre inúmeras outras frentes que eu valorizo cada vez mais nesta nossa passagem finita aqui.
A frase do Confúcio (que já citei algumas vezes) sempre é muito útil e poderosa para esta e outras situações:
Todos temos duas vidas e a segunda começa quando percebemos que só temos uma.
Como equilibrar dinheiro e tempo?
Então quer dizer que você não quer mais ganhar dinheiro e vai viver de amor e vento? Óbvio que não. Mas, pelo menos, (i) estando consciente das escolhas e (ii) entendendo (e tentando prever) as implicações de cada tomada de decisão com relação às outras variáveis da vida (tempo, saúde, família), vou seguir melhores caminhos para minha jornada e meu bem-estar. Sem dúvidas!
Resumo (TL;DR)
A minha reflexão de hoje vai nesta linha:
Algumas verdades que você sempre recitou podem não mais fazer parte das suas crenças e convicções dependendo do seu momento de vida.
Nem tudo se aplica da mesma maneira para tudo (escalabilidade). Tudo é relativo, como diria nosso camarada Albert Einstein.
Ambição não se relaciona somente com dinheiro ou posses materiais.
Não vai ter como escalar este período que me resta de colo para a Luiza, ele é linear e regressivo. Então, a única coisa que posso fazer sobre o tempo, é aproveitá-lo e maximizá-lo em termos de:
(i) quantidade,
(ii) com quem quero utilizá-lo e
(iii) com que qualidade (presença).
Com estas três variáveis, sigo convicto sobre os riscos de escalar qualquer coisa focando somente e exclusivamente na variável financeira.
Time Billionaires
Graham Duncan, Co-Founder de um family office chamado East Rock Capital, definiu a expressão “bilionários de tempo” para quem tem mais de um bilhão de segundos de vida:
Um milhão de segundos são 11 dias, enquanto um bilhão de segundos é pouco mais de 31 anos. Nós, nesta cultura, endeusamos hoje os bilionários de dinheiro, mas os jovens de hoje deveriam se atentar mais e se auto denominarem como bilionários de tempo que são.
Somos bilionários de tempo (grandes probabilidades)! Bora aproveitar essa riqueza! E vamos fazer isso de forma consciente, presente e sem precisar escalar tudo que você vir na frente em busca somente do bilhão (de reais).
Seja um ARTISTA criativo com seu tempo!
Por hoje é só!
Obrigado pela leitura, e até semana que vem!
Marcel | Status Quê?
Só Sei Que Nada Sei
(curadoria de links para você saber cada vez menos)
Jejum de Dopamina: Como eu enganei meu cérebro para gostar de fazer coisas difíceis
(vídeo, 7min28s, em português)
Para você entender um pouco mais, e de forma super didática, sobre a dopamina e sua importância no nosso corpo.
How boredom can lead to your most brilliant ideas - Manoush Zomorodi
(vídeo, 16min03s, em inglês com legenda em português)
Para você entender porque várias ideias surgem no chuveiro.
Eu mudei de carreira depois dos 40 anos. E foi isso que aprendi. - Denise Bobadilha
(leitura, 5min40s, em português)
Quer mudar de profissão? Inspire-se neste caso e veja as 8 dicas de ouro.
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